O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), colheu nesta segunda-feira (9) o depoimento do deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), ouvido como réu no processo que investiga uma suposta tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022. A oitiva foi realizada mesmo após a Câmara dos Deputados aprovar, em votação expressiva, o trancamento da ação penal. O presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), havia apelado publicamente por "respeito entre os poderes", mas foi ignorado por Moraes.
Na última sexta-feira (7), a Câmara dos Deputados aprovou, por 315 votos a favor e 143 contra, a suspensão da ação penal contra Ramagem. O pedido teve como base o artigo 53 da Constituição, que garante imunidade parlamentar para deputados e senadores por atos praticados no exercício do mandato. A avaliação da maioria da Casa é de que o prosseguimento da ação pelo STF sem autorização legislativa representa uma afronta à separação entre os poderes.
Além da votação, a Mesa Diretora da Câmara ingressou com uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) no Supremo, pedindo o reconhecimento formal da violação institucional. O presidente Hugo Motta foi à tribuna afirmar que a decisão da Casa não se tratava de proteger indivíduos, mas de preservar a autoridade do Parlamento frente a "excessos de outros poderes".
Apesar do gesto político da Câmara, Alexandre de Moraes decidiu manter a ação penal contra Ramagem em andamento. O ministro argumentou que os crimes mais graves atribuídos ao deputado — como tentativa de golpe, organização criminosa e abolição do Estado Democrático de Direito — ocorreram antes da diplomação do parlamentar, e, portanto, não estão cobertos pela imunidade prevista pela Constituição.
Moraes determinou apenas a suspensão parcial da ação no que diz respeito a crimes posteriores à diplomação, como dano ao patrimônio público, mas manteve a oitiva de Ramagem na condição de réu, como programado no cronograma das oitivas do "núcleo do golpe".
A decisão provocou reações no meio político. Parlamentares aliados de Ramagem acusaram o Supremo de atropelar a vontade soberana da Câmara e ignorar um dos pilares do sistema democrático: a harmonia entre os poderes.
No depoimento prestado ao STF, Alexandre Ramagem negou ter participado de qualquer articulação para romper a ordem institucional. Disse que documentos e anotações encontrados pela Polícia Federal em seus dispositivos pessoais se referem a estudos sobre o voto impresso auditável e não a estratégias para atacar o sistema eleitoral ou as instituições.
Ramagem também confirmou ter enviado a Jair Bolsonaro um vídeo crítico ao sistema eletrônico de votação, mas alegou que se tratava de uma mensagem privada, sem intenção conspiratória.
Sua defesa reforçou que ele jamais usou a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), da qual foi diretor, para monitorar autoridades do Judiciário ou do Executivo, como apontado em investigações paralelas.
O depoimento de Ramagem integra a série de oitivas da semana com os principais réus do chamado "núcleo do golpe", grupo que inclui também nomes como Walter Braga Netto, Anderson Torres, Augusto Heleno, Mauro Cid e o ex-presidente Jair Bolsonaro.
A insistência de Moraes em manter as audiências mesmo diante da decisão da Câmara reforça o embate institucional entre o STF e o Legislativo. O tema ainda deve ser levado ao plenário do Supremo, mas, até lá, Moraes segue firme na condução da relatoria e no entendimento de que crimes contra o Estado Democrático não podem ser blindados por prerrogativas parlamentares.
Fonte: Fonte83